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Com a chegada do período de festas natalinas, crianças e adultos começam a sonhar com os presentes que gostariam de ganhar. As crianças chegam a escrever cartas para Papai Noel; os adultos nem tanto, mas não é incomum enviarem mensagens ou deixarem recados suficientemente claros àqueles de onde poderia surgir uma “surpresa”.

Os campeões de pedidos, considerando todas as idades e faixas de consumo, são os aparelhos eletrônicos. Entre estes, reinam absolutos os smartphones e tablets. Pesquisas encomendadas pelo mercado revelam que mais da metade dos “pedidos a Papai Noel” envolvem esses aparelhinhos maravilhosos.

É nesse momento que se alarmam as pessoas antenadas com o efeito da tecnologia sobre o comportamento humano. No caso específico, o temor é que os celulares aprofundem ainda mais o fosso que se criou entre as pessoas. Já hoje se noticia que os jovens passam mais tempo de olho em suas telinhas do que nos rostos das pessoas. Isso, considerando relacionamentos profissionais e familiares em conjunto. É aquela cena já comum de uma linda mesa posta, cheia de pessoas, e todas em silêncio, olhando para baixo, e com os rostos levemente iluminados pela luz de tablets e smartphones.

Mas e se for eu o Papai Noel da vez? Como não atender ao pedido de um parente querido? Como vou lhe dar uma camisa em vez do seu sonhado iPhone novo? E olha que nem se está pedindo um aparelho “do zero”; deseja-se apenas um “upgrade” de modelo. Ou seja, o sonho significa apenas a diferença de preço entre o usado e o novo.

Não vou colaborar com a separação da minha família!”, pensa você. “Esses aparelhos são coisa do diabo! Depois que apareceram, ninguém fala mais com ninguém; é presente de grego” (alusão ao cavalo de Tróia, que trazia o inimigo escondido no seu interior)!

Talvez valha lembrar que tivemos reação semelhante com o cinema e sua licenciosidade; com a televisão dentro de nossos lares e o perigo da programação imprópria para as crianças. Também reagimos à Internet, e seu conteúdo sem censura, a distribuir material pornográfico e, de tantos modos, impróprio. Tememos por nossos filhos com o advento das redes sociais, à época acessadas apenas pelo computador da família; o Orkut. Lembro-me que o surgimento do YouTube deixou muita gente apreensiva, pois era uma janela aberta para vídeos de todo tipo; fossem pornografia, fossem sobre fabricação de bombas caseiras, fossem tentativas de aliciamento por radicais islâmicos.

Antes de jogar o celular (ou a televisão, ou o computador) no lixo, devemos considerar que esses recursos são como os ídolos: “têm boca e não falam; têm olhos e não veem; têm ouvidos e não ouvem…”(Sl 115). Nada são, se nossos corações não se deixarem dominar por eles. Caso contrário, tornam-se tiranos impiedosos.

Isso quer dizer que, tal como com um ídolo, um smartphone “nada é”, se nossos corações anteriormente não lhe tiverem erigido um altar, para depois gemer sob seu chicote. E como todo ídolo, seu alvo são as relações. Com Deus, primeiramente, e com nossos irmãos, em seguida. E percebemos um paradoxo: nunca nossa comunicação foi tão fácil; e nunca esteve tão sucinta e superficial.

Não é assim com o dinheiro? A princípio, facilita e até alegra a nossa vida; mas, ao ser invocado como Mamon, transmuta-se em demônio devorador da paz e da felicidade.

Creio que não devamos temer os ídolos, quando nada são. Os smartphones e tablets nada mais são que tecnologia. O poder que eventualmente tenham de nos isolar, de  nos silenciar e separar lhes foi concedido por nós mesmos. E podem ser revogados, a qualquer momento. Basta que nossa conversão e devoção a Cristo cheguem a esta área prática da vida também. Quem sabe se nos escondemos atrás da telinha porque somos tímidos? Ou introvertidos? Quem sabe se já não éramos assim, muito antes que eles existissem?

Praticamente falando, é possível voltarmos a ter uma linda, cheirosa e ruidosa mesa de Natal, onde o tema de honra seja aquele menino que o velho Simeão reconheceu e carregou no colo. Basta que se combine assim. Dispostos os corações, alguém dirá: “esta noite, nesta mesa, celulares, smartphones e tablets serão colocados no seu lugar — em nome de Jesus. E todos dirão: “amém!”.

Se for uma casa de músicos, certamente alguém se lembrará do cântico sobre o Salmo 138:

Eu te louvarei, Senhor, de todo o meu coração;

Na presença dos deuses te cantarei louvores”.

Quem sabe, ali, surja a exortação de que devemos cuidar dos nossos corações, para que jamais tirem os olhos do Criador, como nossa fonte de segurança, significado e esperança.

Por Rubem Amorese

Extraído da Revista Ultimato