Uma característica de viver em uma cultura que oferece tantas possibilidades é perder o foco, não saber o que realmente importa. Vivemos de forma dispersa, seduzidos por uma infinidade de ofertas, criando uma ciranda de opções que mudam constantemente nosso olhar de direção.
A perda da objetividade nos conduz a uma dificuldade na integração das diferentes realidades da vida. Somos seres distraídos, ansiosos e inquietos. A obsessão pela autorrealização, autossegurança e autoimagem surge da necessidade de dar nitidez a um cenário desfocado.
Temos a tendência de pensar que nossos problemas são externos. Porém, se não temos um foco internamente seguiremos à deriva. Como diz o velho ditado: “Quando o piloto não sabe o destino do seu barco, qualquer vento sopra a favor”. As distrações externas apenas refletem a falta de integração interna.
Na carta aos Hebreus, o autor dedica todo o capítulo 11 para descrever, em curtas biografias, a vida de homens e mulheres que viveram vidas focadas. Apesar das inúmeras possibilidades e pressões, mantiveram seus olhos fixos em promessas divinas ainda não cumpridas. Viveram e morreram por elas.
O autor entra no capítulo 12 com um relato e um apelo. Todo aquele elenco de homens e mulheres que viveram vidas focadas tornou-se uma “nuvem de testemunhas”, ajudando e encorajando outros homens e mulheres a viverem da mesma forma. O que eles fizeram? Mantiveram seus olhos fixos em Jesus.
Tenho pensado nas testemunhas que têm me ajudado a não perder o foco. Confesso que, às vezes, olho a minha volta e encontro muita gente que me incentiva com métodos, estratégias, técnicas, programas; no entanto, são poucos os que me ajudam a manter meus olhos focados em Jesus.
Algumas destas testemunhas viveram séculos atrás. Agostinho é uma testemunha fiel que sempre me ajuda a olhar com honestidade para o meu pecado e para a bondade de Deus. Ler as “Confissões” mantém meus olhos voltados para Jesus. Outra testemunha pela qual tenho grande apreço é Gregório Magno, que viveu no século 6. Sua obra “Regra Pastoral” tem me ajudado a manter o foco do ministério pastoral e evitado que me entregue às seduções dos atalhos.
Os movimentos mendicantes do século 13 me ajudam a reconhecer o valor da simplicidade. Os reformadores me inspiram tanto na devoção como no estudo cuidadoso e reverente das Escrituras. Ao longo de minha vida algumas testemunhas fiéis e verdadeiras
me ajudaram a manter meus olhos fixos em Jesus. Várias delas seguem ao meu lado, anonimamente, insistindo para que jamais perca Jesus de vista.
Uma testemunha que teve grande influência em minha vida e pela qual sempre nutri grande admiração é John Stott, que há pouco tempo deixou este “corpo corruptível” para receber “o corpo glorificado”. Ele, com seus sermões, livros e dedicação, me estimulou a amar a Bíblia, a igreja e o Salvador.
A vida moderna, com suas múltiplas ofertas, intensifica o individualismo e acaba por produzir uma forma de ruptura entre a realidade interna e externa. Por outro lado, a revelação de Deus como Trindade, que tem a comunhão e a interdependência de um no ser do outro, forma a base da vida e da espiritualidade cristã. A consciência de que fomos criados por Deus e para Deus estabelece o eixo para vivermos de forma centrada.
Existe um centro na vida: Jesus Cristo. Ele é o princípio e o fim. Aquele por meio de quem tudo existe e para quem todas as coisas convergem. Diante dele se dobrarão todos os joelhos no céu, na terra e debaixo da terra, e toda língua o confessará como Senhor e Deus. Ele é o que se encontra assentado no trono, em torno do qual nós nos colocamos em adoração e obediência.
Precisamos de testemunhas. Nuvens de testemunhas. Precisamos de pessoas que nos ajudem a desembaraçar os nós do pecado e de tudo o que nos impede de caminhar em direção a Cristo. A vida moderna segue nos oferecendo muitas distrações. Manter os olhos fixos em Jesus nos possibilita viver de forma íntegra e centrada.
Ricardo Barbosa de Sousa
Extraído da Revista Ultimato